Tuesday, July 3, 2007

IC 19 - antes e depois


Século XIX -Daí a pouco entravam na charneca que lhes pareceu infindável. De ambos os lados, a perder de vista, era um chão escuro e triste; e por cima um azul sem fim, que naquela solidão parecia triste também..O trote compassado dos cavalos batia monotonamente a estrada. Não havia um rumor: por vezes um pássaro cortava o ar, num voo brusco, fugindo do ermo agreste.

Chegavam às primeiras casas de Sintra, havia já verduras na estrada e batia-lhes no rosto o primeiro sopro forte e fresco da serra.

E a passo, o
break foi penetrando sob as árvores do Ramalhão. Com a paz das grandes sombras, envolvia-os pouco a pouco uma lenta e embaladora sussurração de ramagens e como o difuso e vago múrmurio de águas correntes. Os muros estavam cobertos de heras e de musgos: através da folhagem, faiscavam longas flechas de sol. Um ar subtil e aveludado circulava, rescendendo às verduras novas; aqui e além, nos ramos mais sombrios, pássaros chilreavam de leve e naquele bocado de estrada sentiam-se já, sem se ver, a religiosidade solene dos espessos arvoredos, a frescura distante das nascentes vivas , a tristeza que cai das penedias e o repouso fidalgo das quintas de Verão…

Eça de Queirós – Os Maias

Século XXI - A paz das grandes sombras já não existe nem a embaladora sussurração das ramagens, os pássaros deixaram de cantar e esvoaçam em circulos de espanto e dor , depois de terem perdido o seu lar e os seus haveres, os ninhos onde estavam seus meninos...
De manhã à noite só se ouvem as escavadoras, as moto-serras e os gritos dos homens. As filas de transito cada vez são mais; os acidentes dispararam em flecha. A fidalguia já não vem passar o verão para Sintra, as quintas estão abandonadas, o comércio decadente. Outrora os salaios levantavam-se cedo para ir levar o pão a Lisboa e algumas verduras. Hoje , levantamo-nos cada vez mais cedo mas dificilmente chegamos a horas ao emprego e regressamos sempre mais tarde.
Levaram-nos a paz e a tranquilidade. Agora, as árvores, também !

20 comments:

a d´almeida nunes said...

É imperdoável ter andado tanto tempo afastado deste sítio.
Aterrei mesmo na hora, em termos de coincidências...
Esta comparação é muito emocionante e obriga-nos a pensar seriamente naquilo que pretendemos fazer da vida do Homem neste planeta.
O Desenvolvimento económico a qualquer preço (quantas vezes em favor privilegiado de meia dúzia de galifões/chico-espertos) não pode ser encarado como o objectivo supremo da organização da sociedade.
Imagino a desgraceira que será viajar em horas de ponta no actua IC19! Por acaso da vida não necessito de fazer esse percurso diariamente, como acontece com milhares e milhares de concidadãos, como tu, Greentea, por exemplo, já por aí andei, mas em viagem de passeio.
Por coincidência também coloquei um post sobre o IC2 - a propósito do acidente que provocou o corte total desta via até hoje ao meio-dia.
Beijinhos e temos que ter paciência. Que mais poderemos fazer? Será tudo isto uma inevitabilidade?
António

greentea said...

não há coincidencias, asn - é apenas e só o desenvolvimento económico a qualquer preço que faz destruir matas e arvoredo deixando a nú o casario, a privacidade e a tranquilidade de cada um de nós, agora desprotegidos do som e do perfume dos escapes, invadidos pelo cimento e asfalto às catadupas pelas pontes e mais pontes e viadutos sem fim , desalojando todos os seres que nessas zonas de mata viviam. Este ano já quase não vi borboletas, "joaninhas" nem se fala e abelhas vejo-as morrer aos poucos nos dias de chuva e cada vez menos as vejo poisar nas minhas flores ...

natura.viva said...

Um post muito inteligente e cheio de sensibilidade... Um mundo em S.O.S. que precisa cada vez mais de pessoas atentas como tu greentea.

Jorge P. Guedes said...

Que tristeza! NÃO DESTRUAM SINTRA. POR FAVOR!

Um abraço

pedro macieira said...

O IC19,(antiga estrada de Sintra )tem sido um factor de estrangulamento do concelho de Sintra nos últimos 40 anos, tem havido muitas promessas de criar vias alternativas, nunca realizadas,a Reboleira, primeiro, o Cacém depois, e mais recentemente as Mercês, grandes núcleos habitacionais(dormitórios) caóticos,aumentaram o números de pessoas que todas as manhãs, utilizam todos os meios para chegar a Lisboa (ou obrigados a passar por Lisboa) criando o espectáculo de todos conhecido das longas filas,e o pára arranca, que faz do IC19 a via mais congestionada da Europa.

Culpados há muitos, quase todos a viverem fora do Concelho de Sintra...
Hoje o alargamento tardio está a chegar a Sintra, a desertificação provocado pelas obras, e pelos muros de betão é preocupante, pois altera o equilibrio ecológico de uma grande zona.Criando um aumento de temperatura na própria via, derivado também ao enorme fluxo de trânsito que utiliza aquele percurso a qualquer hora do dia.
O problema das acessibilidades do concelho começa dentro das próprias localidades no acesso á via congestionada do IC19, é necessário que estes autarcas de Sintra que moram em Lisboa, resolvam rápidamente o problema das vias alternativas, e que sejam sensíveis á necessidade de criar zonas verdes, ao longo deste malfadado percurso.
A petição que está a circular a pedir reflorestação, da zona do IC19 é uma medida que pode chamar a atenção sobre o assunto.mas não basta é necessário "martelar" diáriamente, de forma que estes alertas façam algum efeito.
Um abraço

Francis said...

estas fotografias são excelentes.
isto era parte do antigo percurso para Lisboa ?

Pitanga Doce said...

Em Sintra já não há Maria Monfort.

beijos

melga meiguinha said...

Hoje só interessa o que dá lucro.
Querem lá saber do bem estar das pessoas!

Adoro Sintra e, sempre que posso, e que infelizmente não é muitas vezes, gosto de passear por lá.
É um encanto.

Beijocas.

Zé-Viajante said...

Um dia, quando descermos até à curva da "gruta do rio" e olharmos para à esquerda, lá em cima, já não existirá aquela mancha verde de pinheiros e eucaliptos. Haverá uma " nova fitares " ou coisa assim e cada vez respiraremos pior. As árvores, sacrificadas ao alargamento,vão fazer companhia a tantas outras que morrem injustamente.E quem é que pediu o alargamento? Para cada vez mais carros entrarem em Lisboa? Dentro de pouco tempo as faixas são insuficientes e haverá outro alargamento?
Sintra vai deixar de ser o que nós queríamos. Uma Vila Verde

greentea said...

natura.viva

este é um tema para não esquecer !!!

greentea said...

j.g

não só estão a destruir como ontem ainda tive oportunidade de assistir a outro espectáculo : (as imensas filas e o pára-arranca permitem ir observando tudo isto)
na zona de Rio de Mouro, onde há um viaduto pedonal e perto da Estalagem, estão os depósitos do gás natural. Pois não é que os troncos acabados de serrar e a folhagem dos arbustos foi CRITERIOSAMENTE encostada aos ditos depósitos ?
Brada aos céus q cortem as árvores desta maneira , mas que as encostem ao lado dos depósitos do gás até serem levadas pelos madeireiros ...

Toca o sino, a rebate !!

greentea said...

Pedro

as obras para Sintra chegam sempre com atrazo e no entanto Sintra é o 2º concelho em termos populacionais e creio que o 3º em termos de riqueza...
Mas os IC vem sempre atrazados, qd se concluem já estão saturados - foi assim qd há uns 20 anos se fez o IC 19, qd a seguir se alargou, qd se voltou a alargar até ao Cacém e qd agora se está a alargar entre Cacém e Ranholas...
Oiço falar no IC16 /IC30 também há mais de 20 anos , mas não se conclui, falta aqui, falta acolá e esse daria vazão a muito transito e seria alternativa...

Mas não esqueçamos que à chegada a Lisboa, nunca haverá capacidade de escoamento do tráfego que entra na capital diariamente. Há dias ouvia na rádio que as pessoas estão a utilizar cada vez menos os transportes publicos ... é facto porque sai mais caro e não funciona, na maior parte dos casos .

E enquanto tivermos autarcas exteriores ao concelho e q nem sequer cá moram, nunca vamos longe !!!

greentea said...

Já assinei a petição, claro!!

greentea said...

francis

claro q eram as fotos do antigamente

as de agora nem as quiz colocar...

greentea said...

Sintra já não é o que era ...Pitanga

greentea said...

melga

será que ´+e lucrativo desgastar as pessoas com duas horas mais duas ao fim do dia para regressar, com acidentes e stress constante , chegando todos ao trabalho já desgastados e à noite ainda pior?

beijinhos

greentea said...

viajante

as faixas qd são feitas juá estão estreitas e congestionadas porque o desfazamento temporal é abismal...
Há uns anos atrás, morava em Lisboa e comecei a vir para a zona para os fins de semana. Por vezes vinhamos à 6ª feira à noite e a antiga estrada depois de se passar Rio de Mouro e descer até Campo Raso, Terrugem etc era tão deserta e escura que metia medo...não se via vivalma , os carros eram raros e as luzes nenhumas. Se fosses pelo lado de Sintra entrando pelo Ramalhão , era outrra escuridão.

Agora está tudo inundado de casario e luminária e fala-se já de poluição luminosa que afecta os voos dos pássaros e de muitos outros seres que allteraram os seus ciclos de vida...
Ontem, estive numa reunião até tarde. Qd voltei para casa chovia e havia nevoeiro nalguns locais. Mesmo a essa hora o transito era uma gincana autentica, com faixas estreitadas, as protecções a apertarem o cerco e carros a alta velocdade...Um caos!

Rute said...

é um crime o que fazem hoje em dia com a natureza.. Para além de nos levarem o melhor da vida, a paz, com isso os animais também sofrem

Maria Cristina Amorim said...

O Paraiso tornou-se Inferno.
Por alguma rasão foste novamente nomeada.
Beijos.

Maria Cristina Amorim said...

Só recebi a minha hoje mas fica á mesma a intenção só para nós.
Beijos.