Sunday, March 8, 2015

GELADO DE NOZ

Era um dia de verão bem quente. Entrou na gelatariaResultado de imagem para gelataria noz
e ficou a olhar as várias embalagens de gelado , com cores maravilhosas e sabores apetitosos.






Enquanto decidia ouviu uma voz feminina a seu lado pedir um gelado de noz. De imediato, o companheiro questionou-a em tom ameaçador:
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Vais comer NOZ? Sabes muito bem que eu não gosto de noz...
Então, ela em tom submisso pediu um gelado de baunilha.Resultado de imagem para gelataria noz

Lembrou-se então de uma outra história passada há uns quarenta anos atrás. Luisa e o namorado foram de férias juntos pela primeira vez. Eram novos, ambos estudantes universitários, os dois já trabalhavam  e queriam conhecer Barcelona, Sitges , Andorra, San Sebastien... Iam acampar , montavam a tenda onde calhasse ao sabor do vento, da maré e dos humores. Ou dos amores. No primeiro dia ele conduziu sozinho , ela ainda não tinha carta. Montaram a tenda à chegada, arrumaram os pertences e ela fez o jantar e foi lavar a loiça. Ele ficou a descansar junto da tenda, depois dos 600km  que tinham feito. Luisa voltou com o alguidar dos pratos e talheres já lavados e contou-lhe a sorrir que nas lavagens da loiça só se viam homens a lavar os pratos e a arrumar as loiças. Depois disso, nunca mais houve um dia em que ele não a ajudasse ou a fazerem as compras , a ir buscar o pão de manhã, a fazer a comida ou a lavar e arrumar os benditos pratos do jantar.

Penso que isto é também atitude, enquanto umas deixam de comer, usar, fazer aquilo que "eles" não gostam, outras sugerem subtilmente o caminho a seguir não abdicando das suas preferências , do seu perfil, daquilo que são. Foi sempre essa a receita que segui, mantive-me sempre igual a  mim própria sem alterar os meus gostos, ideais, modo de ser, partilhando e sugerindo, fazendo por vezes concessões ou torneando a questão mas nunca abdicando do meu EU., nunca adoptando uma atitude de servilismo perante aquele que escolhi para fazer parte da minha vida.
Recordo as muitas mulheres agredidas , violentadas, violadas, apunhaladas, atraiçoadas, quer este ano quer ao longo dos últimos anos . TALVEZ TUDO COMECE COM UM GELADO DE NOZ...

Wednesday, March 4, 2015

pequenos ditadores

Pequenos ditadoresResultado de imagem para pequenos ditadores

Paula Torres de Carvalho
09/04/2012 - 00:00
Aos consultórios médicos chegam cada vez mais "pequenos ditadores" que os adultos já não conseguem controlar. 
São filhos de pais que têm medo de ser tiranos. Mas as crianças sem limites não são livres, defendem especialistas
"Não vou". "Não quero". "Só faço se quiser". O problema não é uma criança dizer isto. O problema é quando ela faz precisamente o que diz e os adultos já não têm o poder de a contrariar. Não é uma questão portuguesa mas da generalidade das sociedades ditas desenvolvidas. Os consultórios dos pedopsiquiatras e dos psicólogos estão a encher-se de meninos-rei, pequenos ditadores, crianças sem limites, algumas a caminho da delinquência apresentadas por pais aflitos e referenciadas por professores fartos.
Mais do que um problema, a omnipotência destas crianças é um sinal. Tem a ver com a falta de limites que resulta de uma organização social desregrada, sem tempo para o investimento emocional na criança. 
A perspectiva da necessidade de construir "uma cultura da diferença de tempos" defendida pelo filósofo e psicanalista francês Raymond Bénévenque, para quem "é no mundo dos adultos que se deve lutar por um outro futuro das crianças", encontra-se nos discursos do médico pedopsiquiatra Pedro Strecht e das psicanalistas Carmo Sousa Lima e Maria Teresa Sá. Por trás do problema das crianças sem limites, identificam a falta de tempo, a velocidade que muitas vezes não deixa pensar. E a incapacidade de pensar dá lugar à depressão que tem como uma das manifestações a chamada omnipotência infantil.
Em educação tem de haver tempo. "Para haver qualidade, tem que haver quantidade e disponibilidade", considera Pedro Strecht. "Os pais passam muitas horas a trabalhar, muitas crianças chegam a estar 10, 11 horas em jardins de infância e na escola. O reencontro no final do dia acontece numa situação de grande vulnerabilidade emocional com crianças cansadas, com birras, com pouco tempo para cumprir as rotinas e com pais extremamente cansados do trabalho, portanto num ponto de desencontro, de choque e de conflito. Pela falta de tempo e pela culpabilidade dos pais em relação a isso, a permissividade aumentou e aumentou aquilo que vários autores chamam os objectos compensatórios, no que respeita tanto a objectos como à própria relação". A delimitação de regras fica para trás e o que se observa muito hoje - diz Pedro Strecht - é que "temos cada vez mais miúdos que num registo familiar não têm estas balizas e que depois transportam para outros registos, a escola, a sociedade" toda a sua inquietação. 
A dificuldade de impor e de aceitar limites paga-se "caro vida fora", adverte Maria Teresa Sá. "Os pais têm medo do poder. Como que sofrem de um excesso de democracia [entre aspas]. Há uma perversão, como na democracia. Muitos pais têm dificuldades com os limites porque têm medo de ser tirânicos. Têm medo de ser como os pais, como os avós ou como o modelo que eles intuíram da sociedade antes deles", diz Carmo Sousa Lima.
E os exemplos sucedem-se: na escola, António, dez anos. A professora anuncia: "Hoje é teste". Ele cruza os braços: "Não faço". E não faz.
Em casa: Rita, nove anos, filha única. A mãe diz-lhe para desligar o computador e ir para a mesa jantar. Ela continua imóvel à frente do ecrã. A mãe repete a ordem. A miúda não se mexe. Já irritada, a mãe aproxima-se e desliga o computador. Rita protesta, grita e volta a ligar o computador. Empurra a mãe, não vai jantar.
No consultório médico, Pedro, oito anos, para o pedopsiquiatra: "Olha, já parti portas, um dia se tu quiseres, também posso partir esta do teu consultório... Se quiseres ver..."
O número de casos "é muito significativo e, sobretudo em relação a anos atrás, é muito mais intenso", diz Pedro Strecht.
A importância da autoridade
O que faltou ou o que tiveram a mais estas crianças para se tornarem assim? Strecht recua até aos primeiros tempos da vida da criança e da relação precoce com os pais. Refere o médico psicanalista inglês Donald Winicott e a sua ideia de "holding" para explicar a necessidade do envolvimento da criança "num círculo de amor e de força" juntando o afecto e o investimento emocional à fixação de limites. "Na própria relação com o bebé, é isso que se faz", explica o pedopsiquiatra. "Quando um bebé está inquieto, a pessoa pega-o ao colo, envolve-o fisicamente. A modelação emocional é feita também à custa de um "holding físico". O que acontece depois é que os miúdos vão integrando progressivamente e de forma cada vez mais autónoma o holding emocional sem ser preciso tanto o holding físico, de uma forma cada vez mais auto-regulada". Quando isso não sucede pode querer dizer "que não houve esse holding físico de delimitação, de força, no "sentido de contenção emocional e verbal."
A explicação para as manifestações de tirania por parte destas crianças passa então pela pergunta acerca do que tiveram elas a mais. Como nota a psicanalista Carmo Sousa Lima, "o excesso de sim perturbou a capacidade das crianças tolerarem o não", mas "é o não que faz valorizar o sim e não o contrário". Depois do período de "maravilha" e de "encantamento" que rodeia o bebé nos primeiros tempos, os pais devem educar os filhos para a realidade, defende. "Há aspectos da realidade de que os pais não podem proteger a criança sob pena de esta enlouquecer ou cair nessa omnipotência que agora é tão corrente aparecer nos consultórios". Há pais, mães que "são de uma ansiedade tal que a criança não pode sair de dentro delas e continua a viver numa espécie de uma bolha protectora, mas que a vai destruindo em termos de autonomia e de identidade", diz, sublinhando que "são os limites que protegem a criança".
Ao contrário do que muitos adultos ainda pensam, "uma criança sem limites não é uma criança livre", diz Teresa Sá, psicanalista e professora na Escola Superior de Educação de Santarém. Que se desfaça a confusão: "Uma criança sem limites é escrava das suas pulsões e não é feliz, vive angustiada". Entregue a si própria "não tem outro guia senão a satisfação imediata". Se quer uma coisa, agarra-a, se não está contente, bate. E se, a curto prazo, isto até pode ser agradável, "paga-se caro, vida fora". Teresa Sá explica como. "Constitui-se como um verdadeiro sofrimento psíquico, visto que o sujeito se encontra na impossibilidade de se frustrar minimamente, de dizer não a si próprio, e não somente de dizer não ao educador". O que correntemente se designa por omnipotência, "não é unicamente a vontade de dominar os outros e de não levar em conta senão o seu próprio desejo, mas, de igual modo, a impotência e a impossibilidade de se dominar a si mesmo, de se limitar", esclarece. "Parecendo dono do mundo, o sujeito está na verdade desmunido, pois não se sente dono do seu próprio mundo interno".
Daí, a importância da autoridade na educação. Carmo Sousa Lima fala antes do exercício de um "bom poder". A capacidade de lidar com os limites "é um poder muito bom, indispensável", diz. "Todos temos uma margem de poder que está em tudo. Podemos falar, comer, amar, mas há pessoas que não podem. Há patologias que não deixam. Por isso, a palavra o poder em si própria é uma palavra muito boa, com um sentido muito profundo". O bom poder "é o poder de dizer "não" na justa medida das coisas que são razoáveis dizer que não. E de dizer que sim naquilo que ajuda a criar uma melhor pessoa". 
É a autoridade "exercida pelos educadores (pais, professores, instituição) que permite à criança e ao jovem integrar os interditos fundamentais ligados à socialização", salienta Maria Teresa Sá. "Um adulto que permite tudo não é, para a criança, um adulto que lhe dê segurança".As crianças reclamam, aliás, esses limites quando levam os adultos ao limite (a "passarem-se da cabeça e agirem"). É "como se a criança estivesse a levá-los a colocarem limites". E quando isso não se verifica, "pode acontecer que seja a própria criança ou jovem a colocar o limite, em escalada, geralmente com o corpo, caindo, magoando-se, pondo-se em perigo". Sem autoridade "a criança sentir-se-á insegura, deixada só nas perigosas marés da sua impulsividade e destrutividade, abandonada, negligenciada", nota Maria Teresa Sá.
Pedro Strecht alerta, contudo, para o facto paradoxal de, a par da permissividade, existir um regresso ao autoritarismo" e para a necessidade de isso não acontecer. Face às ideias de que, para enfrentar os problemas da educação é preciso uma "educação espartana" e que "antigamente é que era bom", Strecht diz que "não há nada mais falso". "Sabemos que no campo da saúde mental e da infância, isso é absolutamente mentira". E lembra: "Se hoje as escolas estão cheias de problemas, em 1974 a escolaridade obrigatória limitava-se à quarta classe. E se formos ver, há cem anos não havia meninas nas escolas e a maioria da população escolar andava descalça e isso é que era um problema". 
Tem de haver autoridade, sim, mas uma autoridade "protectora", defende o pedopsiquiatra. Que proteja as crianças "dos seus próprios movimentos mais primitivos, mais agressivos", nota Carmo Sousa Lima. Uma autoridade com afecto como defende o psiquiatra Daniel Sampaio. Para promover o desenvolvimento e a autonomia. E "passar de uma navegação à costa para uma navegação à distância", sem a perder de vista, exemplifica Pedro Strecht, deixando claro que se não for feito na infância, este trabalho se tornará muito mais difícil na adolescência. 
http://s.publico.pt/JORNAL/24339123