Todo este céu me recorda Marcelo. Ele dizia-me -"vou contar estrelas" - e tocava em cada uma das minhas sardas. O dedo pontuava os ombros , as costas , o peito. Meu corpo era o céu de Marcelo. E não soube voar, entregar-me ao torpor daquele contar de estrelas.
E regresso à minha mesa de cabeceira para encarar o rosto da amante negra. Aquele foi o olhar que mergulhou, no momento da fotografia, nos olhos do meu homem. Um olhar luminoso, como a luz à entrada de uma casa. Talvez fosse isso, um olhar deslumbrado, talvez fosse isso que Marcelo sempre tivesse desejado. Não seria , afinal, o sexo. Mas o sentir-se desejado, mesmo que fosse por breve fingimento.Sob o céu africano volto a ser mulher. Terra ,vida, água são do meu sexo.O céu, não o céu é masculino. Sinto que o céu me toca com todos os seus dedos. Adormeço sob a caricia de Marcelo. E escuto, longe, os acordes ...:"se você olha para mim eu me derreto suave, neve num vulcão..."
Quero morar numa cidade onde se sonha com chuva. Num mundo onde chover é a maior felicidade. E onde todos chovemos.
Mia Couto - Jerusalém
















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